O Covid-19 é o evento ideal. Inventado, não teria sido mais perfeito. Moralmente é irrespondível. Não queres obedecer porque tens, dizes, o gosto da antiga liberdade? Porque te dizes senhor do teu destino? Dono do teu risco? Se quiseres sê-lo, sê-o, nós não te obrigamos, mas lembra-te, criança, que o que fazes não termina em ti, afecta os outros, sobretudo os velhos e os doentes, os que são mais frágeis. Se não obedeceres, serão os outros a pagar. E a tua rebeldia será marcada pelo opróbrio. Ficará presa à tua pele, muito mais do que a máscara que, insolente, te recusaste a colocar.
liberdade
Viva o 25 de Abril!
Quero aproveitar este dia que hoje se comemora para prestar homenagem a uma série de heróis que fizeram do 25 de Abril de 1974 uma data especial para o nosso país. Em especial, presto a minha homenagem a:
(1) todos os oficiais, sargentos e praças que se dirigiram a Lisboa nessa madrugada para derrubar um regime político odioso, acreditando que iam devolver a liberdade aos portugueses, a liberdade no seu sentido mais imediato e genuíno, e que consiste em:
– poder ser sábio ou ignorante, alfabetizado ou analfabeto, boa ou má pessoa, sociável ou misógino, hetero ou homossexual, simpático ou antipático, altruísta ou egoísta, contribuinte ou não-contribuinte;
(2) todos os oficiais, sargentos e praças que não se dirigiram a Lisboa nesse dia, em especial aos oficiais, sargentos e praças da GNR, que poderiam ter resistido e provocado um banho de sangue e que, pela sua abdicação, mostraram um sentido cívico e uma estatura moral digna de todos os elogios;
(3) todos os portugueses que, antes do 25 de Abril, combateram pela realização da verdadeira liberdade em Portugal, e que pagaram pelas suas crenças e pelas suas acções com o encarceramento e a tortura nas prisões do regime derrubado;
(4) todos os portugueses que se viram constrangidos nos actos e pensamentos durante os quarenta e seis anos do regime derrubado, em especial os milhões que tiveram de emigrar e deixar os seus entes queridos para prosseguir os seus sonhos de prosperidade e de liberdade e evitar a miséria material e espiritual, incluindo os que foram para África e aí tentaram reconstruir a suas vidas;
(5) todos os portugueses vítimas das guerras coloniais, em especial os portugueses brancos que foram chacinados na guerra, as populações negras que morreram para recuperar a sua independência e proteger os que lutavam por ela e os militares que chacinaram os negros e nunca recuperaram do trauma de o terem feito;
(6) todos os seres humanos que, desde o século XVI, em certas partes da Europa e da América, dedicaram a sua vida à causa da razão e da liberdade, em especial os cientistas, técnicos, inventores e filósofos que fizeram a verdadeira e irrevogável Revolução, a única que não perece e devora os seus próprios filhos: a das Luzes e da Liberdade incondicionada.
Finalmente, presto a minha homenagem a todos os meus contemporâneos, que tendo vivido antes, durante e depois do 25 de Abril em Portugal, e passado por tudo isto, nunca esmoreceram na sua convicção de que a liberdade é possível e nunca cederam à tentação de abdicar dessa crença em nome das conveniências pessoais, do conforto ideológico ou do cinismo. E que, last but not least, nunca precisaram de levantar, durante todo esse tempo, um punho fechado e gritar: ‘morte a…!’ para se sentirem realizados.
A estes últimos, em especial, eu digo: Viva o 25 de Abril!