Em 1905 Lev Tolstoi escreveu um pequeno conto, a que deu o nome de Aliocha Pote (Alesha Gorshok), baseado, ao que se diz, na figura de um criado da sua propriedade de Yasnaya Polyana. Aliocha, que nunca aprendera, por falta de capacidade e de tempo, a ler, e cujo horizonte vital não ultrapassará a do seu entorno imediato, personifica uma posição face à existência que é um ideal de Tolstoi na última fase da sua carreira como escritor e como pensador: um modo de ser radicalmente cristão, desprovido de qualquer egocentrismo. As crianças riem-se de Aliocha, Aliocha ri-se de si próprio e tudo está bem. Está bem aqui e estará bem lá.
A tradução deste conto baseia-se na de António Pescada, in Os Últimos Escritos (Relógio d’Água, Lisboa, 2018), com algumas alterações aqui e ali. Espero que gostem.

Fac-símile da primeira página manuscrita de Aliocha Pote (1905).
ALIOCHA POTE
Aliocha era o mais novo dos irmãos. Chamaram-lhe Pote porque uma vez a mãe mandou-o levar um pote de leite à mulher do diácono, e ele tropeçou e quebrou o pote. A mãe bateu-lhe e as crianças começaram a arreliá-lo com o “pote”. “Aliocha Pote,” passou a ser a sua alcunha.